sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

Vida

Nenhum ser vivo morreu sem conhecer a adversidade.

Eu hoje imagino o seguinte: após instantes, algo acontece. A passagem de Lúcio deu-se quando ele tocou o chão com a cabeça, naquele momento. Minhas pernas arrastavam-se no asfalto, o capacete salvou minha vida e ele estava ali para viver aquilo, a sua morte.

Eu serei julgada. Compreendo a dor da mãe, porque sentir é a porta ao mistério, pode-se sentir dor e amor - um e outro é digno de expressão, sob risco de nos tornarmos doentes. respeito-a e lhe sou solidária. Pagarei pelos meus erros. Contudo, ainda estu cabisbaixa.

A morte é um vento ou uma emoção? E todo ser vivo já sentiu júbilo e

Após morto, Lúcio foi a um lugar? E jackson?! EU creio que ambos sentiram a mesma dor... Oh, meus amigos! Eu sou uma mulher que enfrenta um terrivel desafio: sobreviver a este tipo de culpa.

Nunca fui uma pessoa perfeita, creio agora ser difícil me amar. OU talvez eu possa compreender que o julgamento abrirá um nova porta em meu destino... serei condenada. EU matei meu amigo, Lúcio.

Sofro uma dormência concentida. Dão-me remédios, como a Jonas, recem-operado, no terceiro andar desta fortaleza. Seu coração partido parou por instantes e ele veio para cá... cuido dele, cuidamos um do outro, mesmo dormentes.

Sofro, mas hei de me restabelecer. Sei que posso ser perdoada por Lúcio, eu não quis matá-lo. Sei que poderei perdoar-me, eu não quis que ele morresse. Não adianta pensar sobre isso...

O tempo passa e minhas mãos conseguem desenhar aqui e ali. Não estou aprisionada, e sei que não o estarei, embora condenada. Queria ter visões da minha vida e além dela, a vida de Lúcio de agora em diante. E a de Jackson. Estou cega, estou surda, lânguida e atônita para o que ocorre neste planeta.

Como uma leoa que vi dias desses na tv, após deixar para trás sua cria atacada por ienas, incapaz de acompanhar o grupo nas andanças. Aquela cria conhecera este momento de abandono e solidão, como conhecera a face de sua morte. E sua mãe lhe dizia no filme, ao mugir, talvez: "estarei consigo um dia, meu filho".
Os animais conhecem o desespero e a esperança. Penso que não conheçam a ilusão, ou a fantasia. Porém sabem que a morte é inevitável e brutal, por que a morte existe e nos cobre a todos, seres vivos. E aquela mãe demonstrou sua dor de perda à sua cria aleijada.

Como sabem principalmente os elefantes que, ao passarem por restos mortais de outros elefantes, reverneciam-nos tocando-lhes os ossos com as trombas, jogado-lhes areia ou folhas, em silêncio cerimonial.

Eu reverencio Lúcio, meu amigo e Jackson, meu herói.
Estou morta também, perdida, imprestável.
Acredito em minha redenção, entretanto. Acredito em meus sentimentos e eu perdôo Lúcio. E me perdôo.
Eu o amo, amigo querido. Amo-o cachorro Jackson, filho de um cão ladino, companheiro de uma jóia, menino de eetiqueta familiar, monino lindo. Jonas está no terceiro andar. Voltarei a dormir em minha torre, e só retorarei a este espaço hetéreo, que me ouviu por todos esses meses, quando acordar redobrada.

Amo-o também, espaço aberto e vazio. Quarto aconchegante de minhas lamúrias e do meu drama.
A nossa vida, de agora em diante.
A presa está morta. O leopardo espia e procura por uma árvore. Uma iena grita com inveja e ardil.
Lobos correm a atacar um gnu, um tubarão despedaça uma lula, golfinhos aterrorizam cardume de sardinhas, coruja voa no escuro, mergulha no ar e apanha uma ratazana rente ao chão, os cães da pradaria avisam da aproximaçõ de um caçador.
Eu agora estou alhiea a tudo isso, irei apenas dormir. Continuarei viva, por mim e por Jonas. O meu tempo não acabou, porém agora estou estática e cansada.

Obrigada por tudo.
Até logo mais.

domingo, 21 de dezembro de 2008

Humana

Há os olhos de quem morre. De certo, poucos sãos os que viram os olhos de um igual a morrer. A iminência do fim... Será que a morte é um mistério também para os outros animais?

Faz todo o sentido para o búfalo, herbívoro, servir de alimento ao leão? É provável que sim. Talvez, ele apenas se pergunte, "por que dói tanto"? Talvez a sua manada sinta a sua falta, ou talvez os demais nem notem a sua ausência, em meio aos outros.

O mistério, para mim, é a dor de quem morre, a asfixia do último suspiro, aquele ir sem volta. É uma solidão tão intensamente vivida... engraçado eu me lembrar de uma emoção vivida na morte. Agora, eu sei que comigo estava também a morte naquela tarde.

Minha emoção transborda em lágrimas, mal consigo escrever. Sou agora como um chimpanzé que entra na jaula pela primeira vez. Sou a baleia capturada por um arpão em pleno mar. A minha dor é uma dor da raça. Eu... fiz. A cada segundo a sensação do meu amigo a me apertar o abdome, antes da batida...

Não o quis fazer, não sei. Revi a história toda, Felício morreu. Há em mim um inacabável buraco.

A morte a espreita. Jackson... Jonas piorou seu estado de saúde. Ninguém consegue encontrar o cão, estamos todos como que atados. Preocupo-me mais com Jonas do que comigo. e eu parar para pensar em meu drama e meu futuro e minhas mortes, terei que atravessar uma enorme correnteza, a arranhar minhas pernas e a esmorecer um pouco mais a cada passo. A querer voltar ao ponto de partida. A querer curar Jonas, a querer encontrar Jackson.

Sei que ele morreu e estou atada. Sou a ovelha ao se confrontar com a lâmina que porá fim à sua vida. Sou a morte. Se ao menos encontrasse Jackson e conseguisse salvar Jonas...

A minha raça é miserável. Sua estrada levou-me a querer experimentar o perigo, porque creio ser maior, inatingível; creio ser eterna e creio ser única. Ser humana parece-me o pior dos privilégios.

Sou o cocô do cavalo do bandido. Sou o cavalo e o bandido. E sou a dor tremenda e aguda. Estou morta também.

Há os olhos de quem morre e o coração de quem mata. Porém, há uma razão para isso e a presa a conhece tanto quanto o predador. Por que dói tanto? Por que me sinto presa ou predador, quando sei que eu não tinha fome, quando eu não sou uma leoa à caça? O que me fez chegar até aquele cruzamento?

Eu sou humana e preciso de amor... Há alguém que pode me devolver esta luz. Jonas não pode morrer também. Estou cansada.

sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

SMS

GUTA
ESTOU MELHOR, OBRIGADO POR TUDO.
ME IRMÃO VIU O RAPAZ QUE ROUBOU MEU CACHORRO.
PEDI A ELE PARA IR AO SEU QUARTO LHE DIZER COMO ELE ERA.
AJUDE-ME, GUTA.
EU ESTOU MUITO TRISTE.
PENA EU NÃO PODER IR AO SEU QUARTO.
ESTOU SEM FORÇAS. MEU CORAÇÃO ESTÁ PARTIDO.
JONAS.

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

A armadilha

Jonas sentiu-se mal, está internado aqui, no terceiro andar.
Eu, inválida isolada numa torre transparente, sequer posso descer, para vê-lo e tentar acalmá-lo.

Acho que somente Jonas reconheceria minha dor, assim como eu reconheço a dele tão bem. Sei o que é sentir haver perdido uma parte fundamental de minha vida. Sinto-me como um salmão preso a uma rede, que vê a sua família ficar para traz de si - eu sou este peixe e sou também o que escapou da rede. Sou o que sente perder o ente querido, estando ele próprio absolutamente perdido e o que perde o ente querido e se alivia por ainda estar vivo.

Não consigo pensar em outra coisa. Sou culpada por Jackson também? O que eu poderia fazer por Jonas que não fiz?

As perguntas têm resposta, e eu estou envolvida demais com este sequestro do Jackson que peço licença para sentir mais nada.

Estou vazia, estou morta. Felício... Jackson levou consigo a luz no fim do meu túnel, ou eu serei a luz no fim do túnel dele? Onde está meu amigo, onde está Jackson? A mão em meu abdome, o instante final e a triste história do menino cantor, de coração doente, sem seu grande compenheiro, evado infamemente por alguém que se julga apto a alterar a vida de um ser vivo, de quebrar um laço tão intenso e belo de interdependência.
Estou certa de que este rapaz irresponsável não enxerga para além do seu próprio umbigo. Não consigo ver um modo pior de se ser perverso. O que quer que eu tenha feito, o que quer que estas pessoas todas querem tanto saber de mim não é tão grave quanto isso, que este menino fez ao Jonas e ao Jackson.

Em respeito a isto e por reconhecer este como ponto máximo de deturpação das nossas relações conosco mesmos e com os demais outros animais, fico calada. Sinto todas as dores que me cabem, entrego-me a elas, deixo-me dilascerar por dentro, trancada com um segredo monstruoso, prestes a se revelar.

Num desses documentários que vi, havia uma chipanzé machucada: ela havia sido pega por uma armadilha que quase lhe arrancou uma pata. Ela continuava, perseverante e dolorida, o seu destino de ser elefante. Perdeu algo naquela armadilha, não sabe se continuará a sentir, pela pata machucada, as vibrações distantes que seus irmãos elefantes emanam pela terra; ainda assim, ela segue, ignorante de sua sorte, perdida e impelida pela única alternativa que lhe resta: continuar a ser, apesar das perdas.

Sou eu a elefante e sou eu a armadilha. Sou eu a pata machucada e sou eu a vibração que esta pata, provavalmente, não voltará a sentir.

terça-feira, 16 de dezembro de 2008

Lontra

Desgraça pouca é bobagem.
Como assim, roubaram Jackson?!


Eu estive ontem atropelada novamente, meu corpo mal se movia porque eu estava catatônica. Veronika está comigo a todo o tempo, eu estou como que engessada, muito paralisada.
Entretanto, encontro nova energia para me segurar diante de mais uma situação de trauma. Sobrepôs-se a qualquer dor o sumiço de Jackson.

Os psicólogos queixaram-se a Veronika sobre minha fixação neste menino e seu cão. Eu fui repreendida veementemente por ela, quanto a me afastar deste "problema" do cão, o qual eu não estou em qualquer condição de resolver. Verdade, e justamente esta é minha aflição: não o poder encontrar e salvar.

Por que teríamos que perdê-lo? Quem, em sã consciência, pensaria ser melhor para este cão viver com quem quer seja, afora Jonas? Não poder conforontar esta prepotência é o que me atordoa.
Uma coisa é perder algo por um golpe do destino, outra bem diferente é perder algo importante por conta da atitude presunçosa de um adolescente humano sem qualquer responsabilidade para o ocupar, e sem pais suficientemente seguros para o impedir de fazer tal coisa.


Portanto, deixei que Veronika, os médicos, meus pais e todos os que se ocupam de me "recuperar" contivessem todas as preocupações cabíveis ao meu caso e vim aqui revelar que mechi meus pauzinhos para ajudar Jonas a encontrar seu companheiro: liguei para um segurança de meu pai e o fiz entrar em contato com Jonas e sua família, a fim de encontrarem Jackson.

Foi o que eu pude fazer para impedir que mais uma tragédia aconteça. Depois, eu me ocuparei de descortinar as sensações trazidas pela memória ainda turva, pelas visões horrendas de um braço que me envolvia o abdome, antes de eu sentir o caminhão chegar...

Oh, deixe-me tentar salvar uma família, compensar a mim mesma o mal que eu provoquei...
Não posso me negar a, antes de qualquer coisa, descobrir que EU provoquei um evento muito triste, que enche de amargura toda a raça.
EU estou tomada por um fluxo intenso de um azedume que me preenche toda, principalmente depois de me deparar com a iminência de outro acontecimento que poderá tornar pior a vida neste planeta: a morte de um cão cuja dominação parece alterar o sentido da "superioridade" humana sobre os animais.


Um cão que canta e, assim, junta-se a nós por laços inimagináveis pelo primeiro predador humano que pensou, "eu posso cercar e tratar esta cabra selvagem, controlar sua vida de modo a que ela me forneça alimento, a mim e aos meus, enquanto durar sua vida". Entre Jonas e Jackson não há controle, há interdependência, que é a base das relações na natureza.

Sinto-me oprimida por um mal da raça.
Sei que não terei para onde mais fugir e estou fraca.

O que quer que eu tenha feito não é pior do que o que este jovem faz de mal a Jonas e a Jackson. Ao tentar salvá-lo, estendo uma mão a tentar também salvar-me... de mim mesma.

Depois que eu souber que Jackson está bem e a salvo com jonas, estarei preparada para enfrentar meu drama, assim o espero. Até lá, quero mergulhar, como uma lontra, pela escuridão deste rio que flui e deixa à minha volta uma mancha verde escura e espessa, amarga e triste, a me mostrar que uma desgraça nunca chega sozinha.

SMS

GUTA,
ONTEM ROUBARAM O MEU JACKSON.
FOI MUITO RÁPIDO, EU NÃO VI O RAPAZ LEVA-LO.
NÃO SEI O QUE FAZER.
NÃO ESTOU ME SENTINDO BEM.
POR FAVOR, AJUDE-ME!